domingo, 19 de março de 2023

ALEXANDRE VANUCCHI LEME * Ernesto Germano Parés / RJ

 ALEXANDRE VANUCCHI LEME

ASSASSINATO DE ALEXANDRE VANNUCCHI LEME

Ernesto Germano Parés / RJ

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Alexandre Vannucchi Leme nasceu em Sorocaba, no dia 5 de outubro de 1950. Era estudante de Geologia da Universidade de São Paulo (USP), primeiro colocado no vestibular, e militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), quando foi assassinado. Conhecido pelos amigos pelo apelido de “Minhoca”, o jovem estava tentando reorganizar o Diretório Central dos Estudantes (DCE) da USP, o que era ilegal na época. Tinha apenas 22 anos quando foi preso pelo DOI-Codi, em São Paulo, em 1973.

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Filho dos professores José de Oliveira Leme e Egle Maria Vannucchi Leme. De família católica, sua mãe tinha um irmão padre e três irmãs religiosas. Alexandre era o mais velho dentre os seis irmãos, as meninas Maria Regina, Maria Cristina, Miriam e Beatriz, e o menino José Augusto. Teve uma vida escolar exemplar em Sorocaba e Itu (SP). Era sobrinho do então padre Aldo Vannucchi, que fora assistente da Juventude Operária Católica e preso no início da ditadura militar.

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Participava de todas as lutas comuns aos estudantes da época: contra o ensino pago, contra a falta de verbas, contra o fechamento do CRUSP. Por outro lado, como estudante de Geologia, foi extremamente preocupado com a questão dos recursos naturais do país devastados pelo capital estrangeiro. Sobre o ciclo da exploração do ferro, editou um boletim especial do Centro Acadêmico da Escola, no qual enumerava as principais jazidas e empresas exploradoras. Tomou posição contra a Transamazônica, do modo como estava sendo feita. E passou a fazer, junto com outros colegas, exposições e palestras em outras faculdades e escolas do 2° grau.

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Pelos documentos obtidos muitos anos depois pela Comissão da Verdade, Alexandre foi visto pela última vez na USP, em 15 de março de 1973, quando assistia às aulas, por volta das 11 horas.

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Os pais começaram a procurar por Alexandre em 20 de março após receberem um telefonema anônimo dizendo que seu filho estava no DOPS/SP. Ao chegarem ao departamento foram informados de que ali não havia nenhum registro no nome de Alexandre. Procuraram ainda no DEIC, no Degran e no DOI-CODI, mas não obtiveram qualquer informação. José de Oliveira veio a tomar conhecimento da morte de seu filho ao ler uma notícia no jornal Folha de São Paulo.

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Novos dados agora revelados dizem que a prisão de Alexandre decorreu da delação de um militante da ALN, João Henrique Ferreira de Carvalho, o Jota, que passou a trabalhar para os órgãos repressivos. Mas carece de confirmação.

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A morte de Alexandre foi justificada pelos torturadores, diante da acusação dos demais presos políticos, como tendo sido provocada por suicídio com auxílio de uma lâmina de barbear. Tal versão foi desmentida nos depoimentos prestados na 1ª Auditoria Militar, em julho de 1973, pelos seguintes presos políticos: Luís Vergatti, César Roman dos Anjos Carneiro, Leopoldina Brás Duarte, Carlos Vítor Alves Delamônica, Walkíria Afonso Costa, Roberto Ribeiro Martins, José Augusto Pereira, Luís Basílio Rossi e Neide Richopo.

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Segundo o atestado de óbito, a morte de Alexandre ocorreu em 17 de março e seus dados de identificação eram conhecidos pela polícia. Contudo, foi sepultado como indigente, sem caixão, em cova rasa forrada de cal virgem, a fim de que a decomposição do corpo fosse acelerada e as marcas evidentes das torturas que o levaram à morte fossem apagadas. A necropsia assinada pelos legistas Isaac Abramovitc e Orlando Brandão, em 22 de março de 1973, confirmou a falsa versão oficial, segundo a qual Alexandre teria se atirado sob um veículo, sofrendo contusão na cabeça.

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Os delegados de polícia Sérgio Paranhos Fleury e Edsel Magnotti, ao falarem com o pai de Alexandre, forneceram versões díspares e contraditórias para a causa da morte: Fleury confirmou a versão "oficial", de que Alexandre fora morto atropelado, e até lhe ofereceu, como um macabro presente, a placa do caminhão que o teria matado. Já Edsel Magnotti afirmou que Alexandre teria cometido suicídio.

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Para aumentar a confusão, no dia 23 de março de 1973 os órgãos de segurança divulgaram sua morte, a versão apresentada era a de que Alexandre fora atropelado ao tentar fugir da prisão na rua Bresser, em São Paulo, quando era levado ao Hospital das Clínicas. E as notícias foram publicadas nos jornais A Gazeta e Jornal da Tarde.

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Em depoimento publicado na Folha de São Paulo, em 27 de abril de 1978, a auxiliar pedagógica Neide Richopo, outra presa política, contou que “além de ser torturada e de assistir torturas praticadas outras pessoas, presenciou também o assassinato de um rapazinho no DOI, chamado Alexandre; que se ouviam os gritos de tortura de Alexandre durante dois dias e que, no segundo dia, ele foi arrastado, já morto, da cela onde ele se encontrava, e depois disso, os interrogadores apresentaram, pelo menos, três versões sobre a morte dele como sendo suicídio, sendo que a versão oficial é totalmente diferente das três anteriores, que era de que ele havia sido atropelado; que jamais poderia ser atropelado porque já estava morto quando saiu do DOI. Que tudo o que disse com referência à morte de Alexandre é porque encara isso como meio de coação psicológica. Se a interrogada não assinasse o seu depoimento, poderia acontecer com ela o mesmo que aconteceu com Alexandre".

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Cerca de 5 mil pessoas foram à missa celebrada em sua intenção na Catedral da Sé, pelo arcebispo de São Paulo Dom Paulo Evaristo Arns, no dia 30 de março de 1973, entre estudantes, artistas, autoridades, sindicatos e militantes contra a ditadura.

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Foi justamente o sentimento de revolta contra o brutal assassinato do colega, somado à prisão de 44 alunos da USP, o que impulsionou o ressurgimento do movimento estudantil brasileiro. O cantor e compositor Gilberto Gil, chamado para denunciar essas prisões, fez um show na Escola Politécnica da USP, em que falou sobre política, movimento estudantil, arte engajada, imperialismo estadunidense, entre outros assuntos. O show, que devia durar apenas meia hora, teve mais de três horas, um gesto de desobediência civil, num dos momentos mais tensos da ditadura militar.

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VIVA ALEXANDRE VANNUCCHI LEME!

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POR TODOS OS QUE TOMBARAM DEFENDENDO UM BRASIL LIBERTO!

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POR TODOS OS QUE CONTINUAM NA LUTA!

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