quarta-feira, 27 de março de 2024

REFLEXÕES FEMININAS SOBRE O ATAQUE SIONISTA À PALESTINA * Ashjan Sadique Adi/FEPAL

REFLEXÕES FEMININAS SOBRE O ATAQUE SIONISTA À PALESTINA

Eu gostaria de compartilhar uma reflexão sobre a qual venho pensando há alguns dias. Há muitas pessoas em solidariedade à Palestina no atual momento. Exercendo seu apoio em lives, manifestações, palestras, debates, escritos, reportagens, boicotes. Discussões, discussões e mais discussões. Lula denunciou a situação da Palestina enquanto genocídio; as pessoas estão lendo poemas de poetas palestinos, Israel foi denunciado para a Corte de Haia e para o Tribunal Internacional de Justiça, ocorreram derrotas de Israel quanto à narrativa, apesar do braço armado midiático ocidental, o isolamento geopolítico e a mobilização dos povos do mundo que têm peso a favor da resistência do povo palestino. Enquanto Palestina, agradeço todo apoio e reconheço sua importância, mas em verdade, nada mudou de efetivo. Já somos mais de 32 mil seres humanos mortos; as crianças estão morrendo de desnutrição, de fome, de sede, assim como mulheres e homens. Ah, os homens palestinos, excluídos das estatísticas que só destacam mulheres e crianças. Mas os homens também morrem, não esqueçamos, e são seres humanos tanto quanto. E os animais, cães, gatos, cavalos, alguns jogados de abismos pelos soldados, milhares soterrados.

E o que vou dizer é algo que geralmente compartilho apenas com homens. Nunca tive a oportunidade de conversar esse tipo de assunto com mulheres. Mas o que vai libertar a Palestina, e esta não é uma opinião pessoal, mas de muitos (homens) é a luta armada ou a intervenção militar. O resto é retórica, é papo, é discurso, que nada mudará. É necessário que países apoiadores da Palestina entrem em guerra contra Israel e forneçam armas, tanques, bombas, soldados. Porque a diplomacia é abjeta, nunca foi a nosso favor, e apenas alterou nossos mapas, permitindo mais roubo e invasão. A diplomacia é uma balela, uma obscenidade, para quem está com as pernas amputadas, com os filhos sob escombros e sofrendo cirurgias sem anestesia. Diálogo, pombinha, rosa branca, o cara*. A diplomacia é para quem tem comida na mesa, não para quem vai catar a farinha que cai de aviões e recebe tiros de fuzil de Assalto Galil. Sei que é difícil, mas não há outro caminho, do contrário lá se vão mais mortes e colonização na nossa história manchada de sangue e dor. E, aí sim, será uma guerra, de igual para igual, onde os dois campos se encontrarão em nível proporcional de luta e de combate. Porque insisto, a burocracia, a solidariedade, a retórica nunca nos foi suficiente para uma efetiva transformação nesses 76 anos de opressão. Quantos mais precisamos?!

E especificamente quero falar da Psicologia; minha área de atuação. Existe a Psicologia Decolonial, a Psicologia Política, a Psicologia Social, a Psicologia da Libertação de Martin Baró que trabalhou o contexto de guerra em países colonizados e a libertação dos povos, a psiquiatria de Franz Fanon, e a violência política do colonizado. Mas essas perspectivas, ainda estão num canto empoeirado e esquecido de nossas bibliotecas, computadores e discussões. É importante, mas não suficiente, falarmos, enquanto profissionais de Psicologia, do Sumúd - a capacidade de Resistência e de Resiliência Palestina, falar da nossa Resistência subjetiva. Mas até quando resistiremos? Até quando teremos que resistir? Até quando teremos que olhar o mar com medo de entrar? Esta resistência só nos ajuda a sobreviver em tempos de “paz” colonial, em tempos de “paz” sob ocupação, não em tempos de genocídio. Milhares de resistentes continuam a morrer sob os bombardeios.

Não somos super-heróis, nem super-humanos, nem super-homens, nem super-mulheres, nem super-crianças, nem super-idosos, somos de carne e osso, e nossa resistência psíquica, mesmo potente, não é suficiente para confrontar as bombas e escombros sobre nós. Não há subjetividade que supere a materialidade da violência, dos tiros, do fósforo branco. É desonesto fazer uma única leitura psicológica da luta, psicologizar a luta e achar que isso, apenas isso, irá resolve-la. Sejamos dignos.

Portanto, discursos de como superar a colonização com algumas dicas e toques, como se fosse uma receita de bolo é risível, se não, absurdo. A Psicologia com seu velho e clássico discurso subjetivo e individual é inoperante para libertar a Causa Palestina. Não colabora com nada. O que mudou na Palestina com as milhões de palavras proferidas nesses últimos meses? Tomada de consciência, manifestações, que bom, mas continuamos morrendo, eis a questão. Já somos 30.200 e nem o cessar-fogo chegou. A Palestina só se libertará quando Israel sentir a dor e morte dos seus, de milhares dos seus. E este dia há de chegar.

Ashjan Sadique Adi – 
doutora em Psicologia Social pela USP e diretora da secretaria de Mulheres da FEPAL – Federação Árabe-Palestina do Brasil.
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